Corrigir, eliminar, acrescentar, realinhar, jogar fora e começar de novo…
by escrever como?
Na pós-produção literária, catar erros ortográficos e morfológicos ou corrigir deficiências na sintaxe são actividades básicas.
E também há que esquadrinhar frase a frase para clarificar o sentido, eliminando incoerências, redundâncias, incertezas.

-Não consigo ler isto, tem de melhorar a sua escrita! -Se melhorar, vai descobrir todos os meus erros ortográficos!
Aqui começa a revisão dos conteúdos do texto, procurando eventuais contradições internas (por exemplo: na cronologia dos acontecimentos e nos detalhes biográficos das personagens) e erros de facto (relativos ao que é exterior ao próprio texto, como a geografia, datas e acontecimentos históricos, dados científicos citados). Mesmo escrevinhadores talentosos e de obra reconhecida falham nestes detalhes, o que também não abona nada sobre o trabalho editorial que devia apoiá-los.
Por vezes, o trabalho da pós-produção revela que frases, parágrafos, capítulos inteiros, têm de ser radicalmente reescritos. Ou simplesmente eliminados. Porquê?
Esse é um dos mistérios da criação literária. Ou talvez resulte do amadurecimento do escrevinhador, depois de ter escrito aquilo que se propunha e quando vê o conjunto dum ponto de vista mais distante, menos emocional. Pode ser especialmente gratificante, porque é uma reescrita que visa realçar o essencial e eliminar o que prejudica, resultando em algo mais elegante, mais atraente, mais contundente, mais…enfim, dá para entender, não dá?
A pós-produção irá agravar a fragilidade do escrevinhador inseguro, ao revelar-lhe deficiências e problemas em demasia (ou assim ele julga), para os quais a única saída que encontra é mandar tudo para o caixote do lixo (ou tecla DELETE). Porém, muitas vezes há vantagem em realinhar o enredo, acrescentar e retirar situações, desenvolvimentos, personagens. Dá trabalho, exige inspiração, consome tempo…pois, na escrita, barato mesmo são só o papel e a tinta.
Que a pós-produção é responsável por alguns suicídios, muitas depressões, bloqueios, destruição de obras inteiras, é algo que todo o escrevinhador deveria ter presente antes de se iniciar na aventura da escrita. Mais grave, no entanto, é a legião de escrevinhadores que não só não tem disto consciência, como depois despreza ou ignora a pós-produção.
Os cínicos dirão que não virá grande mal ao mundo por se escrever (e publicar) mais um mau livro, mais um livro assim-assim, mais um livro chato. E que esses escrevinhadores não estarão a cometer piores barbaridades enquanto se entretêm a escrever. Provavelmente, os cínico estão certos.